Covid 19 têm altíssimo gasto metabólico e pode necessitar Nutrição Parenteral
Foi publicado na revista americana JPEN (Journal of Parenteral and Enteral Nutrition) no dia 19/06/2020 um estudo com 7 pacientes com COVID 19 sob ventilação mecânica e gravemente adoecidos acerca do seu gasto energético (1).
1. Yu P‐J et al. Hypermetabolism and COVID‐19.
Journal of Parenteral and Enteral Nutrition. Accepted Author Manuscript. doi:10.1002/jpen.1948
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SARS COV-2 (Covid 19) |
Muitos pacientes com COVID-19 permanecem hipóxicos (baixa fração parcial de oxigênio) e com hipercapnia (alta fração parcial de gás carbônico) apesar das configurações máximas do ventilador. Uma dissociação entre o grau de lesão pulmonar e a gravidade da hipóxia/hipercapnia foram observadas em pacientes
com COVID-19 (2).
2. Gattinoni L et al. Covid-19
Does Not Lead to a "Typical"
Acute Respiratory Distress Syndrome.
Am J Respir Crit
Care Med 2020.
Isso sugere que a gravidade da
insuficiência respiratória aguda (IRpA) de pacientes com a COVID-19 pode não ser
unicamente atribuível ao comprometimento pulmonar.
A IRpA está associada à produção de citocinas pró-inflamatórias
e indução de um estado hipermetabólico (3) o que demanda elevada ingesta calórico proteica.
3. Kiiski R, Takala J. Hypermetabolism and efficiency of CO2
removal in acute
respiratory failure. Chest 1994;105(4):1198-1203.
Metodologia do estudo: O Gasto Energético de Repouso (GEB) foi calculado utilizando-se a equação de Penn State e medido com o aparelho de Calorimetria Indireta (MGC Diagnostics, Saint Paul, MN).
Todos os pacientes estavam com uma FiO2 ≤ 60%, não necessitaram de Hemodiálise ou de drenagem torácica.
A equação de Penn State é recomendada para uso em pacientes obesos em VM e equação de HB com PA e fator estresse de 1,1, se paciente sem VM
A equação de Penn State é recomendada para uso em pacientes obesos em VM e equação de HB com PA e fator estresse de 1,1, se paciente sem VM
A equação de Penn State é recomendada para uso em pacientes obesos em Ventilação Mecânica.
Resultados: Os 7 pacientes estavam com sedação intravenosa. A idade média foi de 62 anos (faixa de 55 a 74
anos), 5 (71,4%) pacientes eram do sexo masculino, a mediana do tempo de intubação
foi de 19 dias (variação de 3-39 dias). A mediana da pCO2 e da pO2 foi de 60 mmHg
(intervalo 53-72 mmHg) e 75 mmHg (intervalo 61-95mmHg), respectivamente.
A mediana do GEB medido foi de 4044
Kcal/dia, o que foi 235,7% ± 51,7% maior do que o previsto. A mediana da VCO2 foi de 452 mL / min
(variação de 295-582 mL / min) e da VO2 foi de 585 mL / min (intervalo
416-798 mL / min).
Não houve correlação positiva forte entre a proteína C-reativa e
o D-Dímero para ambas as medidas do GEB previsto e aferido (coeficiente
de correlação de Pearson <0,5).
Paciente
|
Idade
|
Dia de
Hospitalização
|
Índice de massa
Corpórea
|
GEB pela
Calorimetria
|
GEB pela Equação
|
PCR
|
D-dímero
|
1
|
62
|
8
|
26,6
|
5186
|
1733
|
7,11
|
13862
|
2
|
74
|
8
|
24,6
|
2845
|
1296
|
0,5
|
2894
|
3
|
70
|
22
|
37,5
|
3052
|
1865
|
13,36
|
1160
|
4
|
57
|
23
|
28,1
|
4044
|
2108
|
3,94
|
980
|
5
|
57
|
30
|
27,4
|
3952
|
1955
|
13,38
|
2019
|
6
|
69
|
32
|
25,1
|
4282
|
1617
|
14,5
|
560
|
7
|
55
|
55
|
25,2
|
5414
|
1753
|
12,6
|
1393
|
Discussão:
Sabíamos que doenças como a SEPSE, o POLITRAUMA e o GRANDE QUEIMADO demandam muita energia porém o observado neste estudo EXTRAPOLA TUDO VISTO ANTERIORMENTE na Medicina.
Um estudo preliminar, conduzido pelo prof. Paul Wirschemeyer da Duke University havia confirmado esta evidência.
O aumento absurdo do consumo de
oxigênio e da produção de CO2 observada nessa coorte de 7 pacientes como resultado de seu hipermetabolismo pode explicar a alta taxas de falha na ventilação
mecânica em pacientes com COVID-19 grave.
Alguns desses pacientes podem ser indicados para a Oxigenação do Sangue por Sistema de Membrana extracorpórea (ECMO). Nesse caso dos 7 pacientes, contudo, o consumo de O2 e a produção de CO2 excedeu a capacidade de transferência de O2 e CO2 dos oxigenadores
adultos típicos utilizados nos circuitos de ECMO.
Essas observações sugerem a
necessidade do aumento da Nutrição acima dos 15-20 kcal/kg de peso corporal/dia real atualmente recomendados para pacientes gravemente enfermos com COVID 19 segundo os Guidelines das Sociedades de Especialidades (ASPEN, ESPEN, BRASPEN).
Embora os pacientes com Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SARA) tenham gastos de energia aproximadamente 30% acima do GEB, têm-se observado que a maioria dos pacientes com COVID-19 tem gastos de energia
superiores a 200% disso.
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Nutrição Parenteral em acesso venoso periférico e central |
IMPORTÂNCIA da TERAPIA NUTRICIONAL:
Um suporte nutricional adequado é
vital para a preservação da função do músculo respiratório, da resposta
imune à infecção e da da lesão oxidativa celular.
No entanto, dado o GEB extraordinariamente elevado observado em pacientes com COVID-19, utilizar puramente cálculos do GEB por equações preditivas pode resultar
em superalimentação e aumento da produção de CO2.
Além de ter implicações para o
manejo do suporte nutricional em pacientes com COVID-19, nossas observações de
hipermetabolismo extremo em pacientes gravemente enfermos com a COVID-19 sugere
possíveis alvos para intervenções terapêuticas que não foram explorado até o momento.
Observações do Blog:
- A Nutrição Parenteral suplementar a dieta por via enteral pode ser uma alternativa segura e viável para se atingir a meta energético proteica.
- A noção de que a Nutrição Parenteral é tão segura quanto a Enteral está bem documentada desde os estudos CALORIES, o estudo suíço da Dra Claudia Heidegger e o estudo NUTRIREA-2. Deve-se, porém, evitar a oferta de um excesso de energia pela via endovenosa (Parenteral).
- Afinal, muito dificilmente um paciente crítico com COVID 19 com excessiva demanda metabólica tolerará um tal volume de dieta enteral mesmo com dietas de alta densidade calórica.
- A Covid 19 é uma doença nova e as evidências são heterogêneas em vários aspectos até que se consigam estudos com grande amostra, duplo cegos, placebo controlados e avaliados por Metanálise.
- Antes disso, é preciso ética, bom senso e faro clínico para não se perder oportunidades de atuar com o melhor da evidência científica disponível.
- Observe-se que o exame da Calorimetria foi realizado após a 1ª semana de internação e de fato, tem se orientado ofertar pouco nos primeiros 10 dias: 18 a 20 kcal/kg/dia. Além disso, a equação de Penn State subestimou a oferta calórica realmente necessária.